sexta-feira, 17 de março de 2017

Em um recanto sombrio entre as colinas

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No final do mês de fevereiro li, em formato e-book  para Kindle, o fantástico "A Assombração da Casa da Colina", da escritora norte-americana Shirley Jackson.

"Nenhum olho humano pode isolar a coincidência infeliz de linhas e locais que sugerem a malignidade na fachada de uma casa e, no entanto, alguma justaposição demente, algum ângulo defeituosos, algum encontro fortuito de telhado e céu transformava a Casa da Colina em um lugar de desespero. Mais amedrontadora porque a fachada da Casa da Colina parecia estar acordada, vigiando pelas janelas vazias e erguendo com sarcasmo a sobrancelha de uma cornija. Quase todas as casas, tomadas de surpresa ou vistas de um ângulo inesperado, podem olhar humoristicamente alguém que as observe; até uma chaminé brincalhona, ou um a janelinha de água-furtada que parece uma covinha, podem dar ao observador um senso de camaradagem; mas uma casa arrogante e cheia de ódio, sempre defensiva, só pode ser maligna". (pos. 412 a 417)

O livro é uma narrativa ficcional que, conforme muitas das resenhas que li, foi categorizada como um "romance gótico" e conta história de uma pequena expedição à sombria Casa da Colina - construída por um falecido milionário chamado Hugh Crain - onde os personagens participam de uma pesquisa de campo destinada a comprovar a existência do sobrenatural, do imponderável.

Na história, temos quatro personagens centrais: Eleanor Vance, uma solteirona triste que deixara de aproveitar a juventude em prol de cuidar da mãe doente; Theodora, uma jovem sedutora; Dr. Montague, o "líder" responsável pela expedição à Casa da Colina; e, por fim, Luke, o herdeiro da propriedade que acompanhou a expedição a pedido de uma tia apenas para evitar a ocorrência de danos na casa. Além deles, em caráter secundário, temos o casal de criados da casa, a esposa de Dr. Montague e seu jovem acompanhante.

No curso da história, Shirley Jackson leva o leitor a explorar a casa, a misteriosa construção na colina, sob a perspectiva dos quatro personagens centrais.
Dessa forma, ora se encara a construção com o bom-humor de Theodora que, como já dito, é uma jovem sedutora e ansiosa por ser o foco de todas as atenções; ora com a cobiça de Luke, o herdeiro que visualiza os bens de valor que a sua futura propriedade possui; ora com a vulnerabilidade de Eleanor; e, por fim, ora com o "didatismo" de Dr. Montague:

"- Precisamente. Não acharam que é difícil demais achar o caminho dentro desta casa? Uma casa normal não poderia deixar nos quatro tão confusos por tanto tempo, no entanto continuamos a escolher portas erradas, a sala que queremos foge de nós. Até eu estou tendo problemas. - Suspirou e abanou a cabeça. - Acho - continuou - que o velho Hugh Crain esperava que algum dia a Casa da Colina ficasse famosa e fosse exibida, como a Casa Winchester na Califórnia e muitas das casas octogonais; ele mesmo projetou a Casa da Colina, lembrem-se, e como já disse antes, era um homem muito estranho. Todos os ângulos - o doutor fez um gesto em direção à porta de entrada -, são ligeiramente errados. Hugh Crain deve ter detestado as outras pessoas, com casas sensatas, de ângulos perfeitos, porque fez a sua de acordo com suas ideias. Os ângulos que você espera, e tem o direito de esperar, que sejam aqueles ângulos retos a que está acostumado, têm realmente um erro de uma fração de grau em uma ou outra direção." (pos. 1299 a 1306)

É importante destacar que os participantes da  expedição não foram escolhidos a ermo pelo Dr. Montague em sua busca pela comprovação científica de fenômenos paranormais. Em realidade, como narra o livro, Theodora além de jovem e sedutora, teria poderes holísticos, enquanto que Eleanor, na infância, teria passado por uma experiência com poltergeists. Nesse contexto, com exceção de Luke, todos, de alguma maneira, tinham alguma relação com o sobrenatural que, na visão de Dr. Montague, facilitaria as pesquisas realizadas na casa.

Entretanto, a despeito dos personagens que habitam temporariamente a Casa durante a expedição, o livro tem como foco central a propriedade. Por essa razão é possível afirmar que a protagonista de toda a história é a própria Casa da Colina, com todos os seus recantos sombrios e enigmáticos.

"Indiscutivelmente, há lugares que inevitavelmente incorporam uma atmosfera de santidade e bondade; portanto não é tão absurdo dizer que há certas casas que nascem más. A Casa da Colina, seja por que for, tem sido inabitável há mais de vinte anos. Como era antes disso, se sua personalidade foi moldada por pessoas que moraram aqui, ou o que essas pessoas fizeram, ou se era maligna desde o início, são perguntas que não posso responder. Naturalmente espero que todos nós saibamos muito mais sobre a Casa da Colina antes de irmos embora daqui. Ninguém sabe mesmo porque algumas casas são chamadas de mal-assombradas." (pos.856 a 860)

Contudo, é nesse ponto que chega aquela parte em que se torna impossível falar mais da história sem incorrer no crime capital de "dar spoiler". Todavia, o que posso afirmar é que "A Assombração da Casa da Colina" é um livro descritivo, que cria toda uma atmosfera de tensão constante, conseguindo assustar o leitor com frases simples como, por exemplo: "então a porta se abriu". Para quem gosta de horror ou que se iniciar na leitura desse gênero, fica a forte dica.

"A Casa da Colina tem reputação de insistir em hospitalidade; parece que não gosta de perder seus convidados. A última pessoa que tentou deixar a Casa da Colina no escuro - foi há dezoito anos atrás, garanto - foi morta na curva da estrada, quando seu cavalo e a imprensou contra aquela árvore grande". (pos. 818 a 820)

*

Ah! Para quem não quiser imaginar e explorar a Casa da Colina por meio da leitura do livro, tem um filme chamado "A Casa Amaldiçoada", baseado na obra de Shirley Jackson. O filme é bem irregular, mas garante alguns sustos...



2 comentários:

  1. Nat, mais uma vez direi: você é tão boa nisso! (não vou deixar de dizer, por mais chato que fique! hahaha).
    Sobre o livro, em que pese meu preconceito com horror, eu entendi que realmente pode ser interessante. Quem sabe não dou uma chance?
    Parabéns e continue!

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    1. Tati, você é minha maior incentivadora neste blog ("não vou deixar de dizer, por mais chato que fique!hahaha"). Um dia dê uma chance ao gênero "horror", e comece por clássicos como este, será uma experiência no mínimo diferente. Beijos.

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